sexta-feira, 28 de março de 2014

NICO ROSSO, O MESTRE DO CLARO E ESCURO!


HOMENAGEM PÓSTUMA, À UM DOS
MAIORES MESTRES DO QUADRINHO
BRASILEIRO!



Na década de 70, eu era um garoto metido querendo fazer quadrinhos e, por sorte, encontrei muita gente boa em meu caminho – e algumas tranqueiras também -, e graças a isso, décadas depois, continuo no ramo editorial. Quando olho para trás e vejo tudo aquilo que consegui realizar profissionalmente, e criar quatro filhas que adoro, agradeço a Deus, por toda essa gente que trombei pela estrada e que de alguma forma contribuíram para o desenvolvimento do meu trabalho (artistas colaboradores, editores, gráficos, publicitários, etc). Afinal, ninguém faz nada sozinho. E, o pouco que fiz foi porque contei com a colaboração de muitos amigos, gente competente que, como eu, adoravam a arte seqüencial.

Tive o privilégio de conhecer meus ídolos dA juventude, que produziam HQs, como o lendário Minami Keizi, Carlos da Cunha,Primaggio, Igayara, Jorge Kato, Jayme Cortez, Reinaldo de Oliveira, Edmundo Rodrigues, Paulo Fukue, Shimamoto, Edmundo Rodrigues, Queiróz, Antonio Duarte, Hamasaki, Ignácio Justo, Nico Rosso e outras feras.

Tive como instrutores de peso, no início de carreira, mestres como Ignácio Justo – um expert em HQs de combate - e Nico Rosso – nos tempos da MINAMI e CUNHA EDITORES, na década de 70.  É justamente sobre o professor Nico - que durante anos ministrou aulas na Escola Panamericana de Arte, do saudoso Manoel Victor -, que decide, desta feita, prestar uma homenagem a este homem que veio de longe – Itália – para engrandecer o quadrinhos nacional.
A seguir, saiba mais sobre este italiano genial que muito contribuiu para as HQs no Brasil.




NICOLA (NICO) ROSSO -
MINI BIOGRAFIA
(1911 – 1981)
Nicola Rosso nasceu em Turim, na Itália, em 1910, 
Chegou ao Brasil em 1947, e em 1948 passou a trabalhar no semanário católico chamado jornalzinho e de 
cara mostro dominar diversos estilos.  



Em seu país de origem, cursou na Academia de Albertina de Belas Artes, estudou retratos com os pintores Giácomo Grosso e Giovani Reduzzi. Viveu por 3 anos em Paris, estudando e trabalhando em todos os setores de artes gráficas. Também lecionou ilustração e história de trajes na Escola de Artes Gráficas Bernardi Semeria.
Desembarcou no Brasil, no porto de Santos, em 1947.
  
Em nosso país, fez ilustrações e histórias em quadrinhos para as editoras SARAIVA, MELHORAMENTOS, EBAL, CONTINENTAL, LA SELVA, TAIKA, EDREL, EDITORMEX, ABRIL, MINAMI E CUNHA, etc.

Seleções de Terror - Editora TAIKA


A Prisioneira - Publicada em Terror Especial 


Criou o Capitão Brasil e Leo, o Destemido. Trabalhou para o Jornalizinho – e logo foi chamado pela EBAL onde desenhou as seguintes série: Edições Maravilhosas – fazendo adaptações de clássicos da literatura brasileira-, e para a coleção Grandes Figuras, onde quadrinizou HQs de grande vultos da história do Brasil, como: Anchieta, Pedro Américo, Monteiro Lobato, Raposo Tavares, Dom Pedro II e outros. 



Ainda para a EBAL desenhou álbuns especiais para de clássicos, como Os Lusíadas  e a saga de Pedro Alvares Cabral (A Descoberta do Brasil). Apesar de ser um especialista em figuras clássicas se deu bem fazendo Histórias de Terror e até o gênero infantil. Na década de 70 estava em plena atividade, fazendo inúmeras publicações. Tanto que, para dar conta da demanda montou uma equipe. Colaboraram com Nico, Kazuhico Yoshikawa e J. B. Rosa. 



Eis alguns títulos com os quais colaborou: revista A Cripta, O Estranho Mundo de Zé do Caixão – para a editora LUZEIRO, com roteiros de Rubens F. Luchetti -, e a revista de humor chamada Terrir – terror bem humorado, onde apareciam macumbeiros e pais-de-santo, e que tinha como pano de fundo o Brasil. Criou e produziu uma edição de humor erótico e também ilustrou a série Mitologia em Quadrinhos. O incansável mestre ainda fez Chico de Ogum – série de humor criada por Carlos da Cunha - e  A Múmia  – escrita por Gedeone Malagola, criador dos super-heróis Raio Negro, Hydroman e o Homem Lua-,  para a MINAMI E CUNHA EDITORES.





Para a editora ABRIL fez belas ilustrações para a série de pocktes books, de histórias policiais, chamada Hardy Boys Detetives.

HARDY BOYS

HARDY BOYS DETETIVES

Com o final da Coleção Saraiva em 1972, Nico Rosso perdeu um dos seus trabalhos um de seus trabalhos mais constantes. Esse vácuo foi preenchido por duas coleções lançadas pela ABRIL em 1972. A editora dos Civita havia fechado contrato com a MANDADORI italiana para publicar uma série de livros dos HARDY BOYS DETETIVES, personagens americanos, criados pelo editor Edward Stratemeyer em 1927 e escritos por vários escritores sob o mesmo pseudônimo: Franklin Dixon. Os personagens haviam sido licenciados para a Itália e adaptados para o público italiano, deixando-os menos americanos do que eram, e foi esse o formato que a Ed ABRIL resolveu publicar. 

Ilustrações para Hardy Boys Detetives
As capas no Brasil eram as mesmas da MANDADORI, mas a edição italiana não tinha ilustrações. Como estavam de olho no público juvenil, os editores resolveram encomendar as ilustrações do miolo para Nico Rosso. E ele as fez com sua habitual maestria e elegância, cerca de seis por edição, durante dezessete volumes mensais.  


Na edição # 46 - Nico estreou em 1948 


O JORNALZINHO

Este era o nome de uma publicação criada pelo padre e editor italiano Don Giácomo Alberione (1884-1971), que em 1914 fundou a Sociedade de São Paulo, e que no ano seguinte também fundou a Congregação das Filhas de São Paulo – mais conhecidas como Irmãs Paulinas -, apoiado por madre Tecla Merlo (1894-1964). 
Essas entidades tinham o objetivo de disseminar a palavra de Deus através de diversas publicações lançadas por elas. Dentre estas estava Il Giornalino, uma revista semanal criada originalmente na Itália voltada para o público infantil, que foi publicada durante 75 anos - entre outubro de 1924 até novembro de 1999. Além do cunho religioso esta publicação também publicava HQs de aventura, humor e ação, e isto prevaleceu durante toda sua existência. Grandes feras do traço passaram por suas páginas como: Sergio Toppi, Dino Bataglia, Alfredo Castelli e muitos outros.

No Brasil Il Giornalino, publicação subordinada ao Vaticano, também obteve um grande sucesso. Em 1941, o Jornalzinho saia em formato tablóide, quinzenalmente, parcialmente impresso a cores.
Na época, o mundo estava em guerra, coisa que o clero discordava, e as agruras dos conflitos acabaram levando muitos italianos a migrarem da Itália. No Brasil se formou uma grande colônia italiana, carente de uma publicação que elevasse seus espíritos abalados. As primeiras edições de Il Giornalino, até 1942, vinham da Itália, de Mussolini,  que estava envolvida no conflito mundial e que não era aliado da América, portanto, “inimiga do Brasil”. Assim, logo foi feita uma versão nacional daquela publicação. E foi assim que surgiu a ideia de inserir em suas páginas material produzido na Terra Brasilis.
Mesmo após o término da guerra o hábito de publicar material produzido por aqui persistiu.



Em 1948, o talentoso Nico Rosso foi convocado para realizar uma série de trabalhos para esta versão nacional, pois este já havia produzido muitas ilustrações para livretos de orações e cadernos de catequese para esses religiosos. Rosso trabalhou por anos a fio para esta publicação religiosa antes de se dedicar de corpo e alma as editoras que lançavam produtos comerciais de diversos gêneros para bancas de jornais.



É incontestável a contribuição que os imigrantes italianos deram ao setor editorial do Brasil. Eles foram os pioneiros por aqui.

OS ANOS DOURADOS DA EDREL
(Breve histórico de uma 
editora revolucionária)


ESTÓRIAS ADULTAS - Fernando Ikoma - EDREL



Podemos atribuir o sucesso obtido pela saudosa EDITORA EDREL muito mais pelos temas de quadrinhos que publicava do que pela qualidade das histórias, dos desenhos, ou da maioria de seus colaboradores.
A EDREL (Editora De Revistas e Livros), foi fundada por MINAMI KEIZI, JINKI YAMAMOTO e SALVADOR BENTIVEGNA, ganhou um status inesperado no final dos anos 60 e o começo dos anos 70.

AMADORES QUE SE DERAM BEM

Foi uma editora cuja proposta era lançar novos talentos. A maioria de seus colaboradores estavam iniciando carreira, enfim, não tinham experiência no ramo, e alguns eram amadores. Na visão de MINAMI KEIZI, o mercado nacional de publicações necessitava de renovação, sair da mesmice, e por isso a empresa optou por lançar, a título experimental, diversos títulos, de diversos gêneros. Por isso, publicavam livros de temas adultos e HQs do tipo super-herói ao terror e muitas HQs com temas adultos, como FIKON – do genial Fernando Ikoma, que trazia HQs psicológicas -, que na época praticamente não existiam. O sucesso foi instantâneo.

 Assim, os carros chefes daquela editora passou a ser histórias em quadrinhos adultas, abordando temas como erotismo, sexo e  drogras. Esses enfoques eram diferenciados daquilo que publicavam os concorrentes, que só lançavam fotonovelas, para as mulheres, moda, carros, futebol, HQs de super-heróis e infantis. Esses novos produtos editoriais, além de diferir de outras linhas editadas começou a atrair para os pontos de venda um outro tipo de público: O adulto.


FIKON - De F. IKOMA


MANGÁS MADE IN BRAZIL

Minami, por ser filho de imigrante oriundos do Japão, apreciava os mangás. Era ciente de que a grande colônia nipônica que viera para o Brasil, para ter acesso a esse estilo de publicação tipicamente oriental tinham que recorrer a importadores como a famosa Casa Ono. Assim, sabiamente, ele decidiu que a EDREL ia lançar o estilo mangá no país. Coincidentemente, nos anos 70, as emissoras de TV do país começaram a exibir séries produzidas no País do Sol nascente que estavam tendo bom índice de audiência, como: Ultraman, Ultra Seven, Speedy Race, Patrulha Fantasma, Astro Boy, etc.  A idéia inicial era comprar os direitos de editoras japonesas para editar as edições de mangás no Brasil.

Porém, jovens como Fernando Ikoma e Cláudio Seto, que eram descendentes de orientais apresentaram algumas HQs neste estilo que agradaram os editores. Minami não hesitou e, de imediato, decidiu investir neste segmento, até então inédito em terras tupiniquins. Conclusão: Sucesso absoluto.
O jovem Paulo Fukue, que também descendia de orientais, foi o único que não aderiu ao estilo mangá, mantendo a linha americanizada. Obteve sucesso com títulos de super-heróis, como: Pabeyma – o primeiro herói de ficção-científica criado e escrito por Nelson C. Y. Cunha, irmão do escriba Carlos da Cunha -, e Super Heros, que faziam a cabeça da garotada. 







De repente, aquela editora começou a se expandir ainda mais. Adquiriu um parque gráfico e peruas para fazer sua própria distribuição. Ou seja, criou uma infraestrutura excelente que atendia com eficiência os revendedores, leitores, dando suporte financeiro relativamente bom para seus jovens colaboradores.  Enfim, jamais, uma editora tipicamente nacional havia decolado tanto quanto a EDREL.

PROFISSIONAIS DE VERDADE

O time de colaboradores da EDREL, com o tempo, cresceu muito. Porém, os dois únicos profissionais de verdade que produziam boas HQs para a empresa eram o desenhista Nico Rosso e o escriba Rubens  F. Lucchetti. Eles fizeram algumas histórias de terror para MINAMI KEIZI, excepcionais, que tinham um layout moderno para a época. As histórias realizadas por essa dupla eram claramente diferentes de todo o material que compunha os diversos lançamentos mensais daquela casa editorial.
Rosso e Lucchetti eram os únicos profissionais de verdade ali, apesar dos quadrinistas iniciantes, que em sua grande maioria fazia parte do staff da empresa, tinham muito talento e criatividade, que comprovaram ao longo das décadas.
Mesmo assim, a EDREL foi um sucesso, que só pode ser atribuído graças a visão incrível de MINAMI KEIZI que acabou revolucionando o mercado editorial daquela época.




OS LIVROS POPULARES

A empresa além de lançar seus próprios livros destinados ao público adulto, também comprava edições de outros editores, montou um eficiente método para vendê-los pelo reembolso postal que gerava um ótimo faturamento mensal.
Dentre os diversos títulos de livros populares lançados por aquela editora estava uma coleção chamada CURSO COMICS, criada e desenvolvida por Cláudio Seto, que obteve sucesso relevante e incentivou muitos leitores a produzir suas próprias histórias em quadrinhos.

A DECADÊNCIA

Apesar das inovadoras publicações venderem bem, a EDREL enfrentava problemas internos e externos. Novos sócios tinham se incorporado ao grupo e algumas divergências começaram a surgir.   
Além disso, a empresa que atuava em plena época do regime ditatorial militar - que tinha implantado a censura prévia, onde uma única criatura tinha o poder de determinar o que o povo podia ler ou não -, passou a ter diversos títulos censurados e até alguns de seus
acabaram sofrendo na pele a repressão, devido aos produtos ousados de temáticas adultas que criavam e desenvolvia, como foi o caso de Paulo Fukue.

Editores de jornais e revistas, assim como gravadoras, emissoras de TVs e de rádios eram obrigados a enviar para Brasília o material que desejavam editar ou lançar no mercado e se submeter ao severo critério de um censor do governo. Não havia liberdade de imprensa no país, e ai daquele que lançasse um produto que tinha sido proibido, vetado. Sofreria as conseqüências.      
A EDREL estava fadada a desaparecer, derrotada por divergências internas, entre os sócios, e problemas graves com a censura do terrível e castrativo do regime militar.
O sonho tinha acabado. Mas a EDREL fez história, deixou saudades a milhares de leitores que acompanhavam fielmente suas publicações. Muitos profissionais da área ficaram a ver navios, sem emprego. Mais uma vez, o quadrinho nacional, que um dia tivera um grande impulso na editora CONTINENTAL, restringia-se a minguados títulos esporádicos, de breve duração, em bancas.

A história do quadrinho nacional sempre teve esses “altos e baixos”. De repente, surge uma editora nacionalista e as HQs Made in Brazil eclodem, pouco tempo depois esses corajosos editores acabam fechando as portas e nossas HQs simplesmente quase desaparecem das bancas. Pelo visto a história é cíclica.

NOVAS ESPERANÇAS

O Lobisomem, um clássico 





 Nico Rosso só voltaria a trabalhar pra MINAMI algum tempo depois, desenhando alguns de seus melhores trabalhos de HQs no final da década de 70, quando foi fundada a MINAMI-CUNHA EDITORES que, infelizmente, também teve breve duração. Se MINAMI sonhava em reviver os feitos que tinha conseguido milagrosamente com a EDREL, desta feita não conseguiu, apesar desta empresa publicar um material de qualidade.

MINAMI-CUNHA - O Lobisomem - 1973 - Nico Rosso 

Anúcio de quarta capa Chico de Ogum - Minami-Cunha Editores

Um novo BOOM das HQs nacionais só surgiria na década de 80 quando surgiu a GRAFIPAR, editora de Curitiba, do sul do país, que tinha em sua direção o genial Cláudio Seto (ex-colaborador da EDREL), que por um bom tempo, abriu espaço para os quadrinistas nacionais, fazendo reviver a mesma linha de produtos destinados ao leitor adulto como nos bons tempos da EDREL. Nesta retomada das HQs brasileiras novos talentos foram revelados, como: Mozart Couto, Watson e Wilde Portela,e outras feras.

PERDEMOS UM BRAVO GUERREIRO 

Nicola (Nico) Rosso, faleceu em 1981. Porém, ele nos deixou seu filho,
 Gianluigi Rosso e seu neto Luiz Rosso, além de um grande legado, pois produziu ao longo de sua brilhante carreira milhares de páginas de diversos gêneros.    

 O estilo do mestre era inconfundível e dava um show, principalmente, na arte do claro e escuro, técnica que dominava como ninguém. Nico Rosso influenciou e inspirou muita gente. E foi ele que apresentou outro grande mestre, Ignácio Justo - um de seus colaboradores nas HQs bélicas, que Nico também fazia-, para a editora CONTINENTAL.
Seu neto, Luiz Roberto Rosso, tai firme no mercado
e se revelou um grande ilustrador. 
Afinal, como diz um adágio popular: “Filho de peixe, peixinho é!”

É bom frisar que, numa época em que ousados editores nacionais como Miguel Penteado, e outros, decidiram hastear a bandeira dos quadrinhos nacionais, muitos estrangeiros contribuíram para a grandeza das artes sequências tupiniquins, como Jayme Cortez - de origem portuguesa -, e Nico Rosso - um italianinho “Buona gente”, e outros.
As HQs nacionais não devem morrer. A batalha continua, agora com os novos talentos e uma centena de editores de fibra, independentes, que também estão fazendo história, fazendo acontecer.
Que os deuses das HQS o tenham em bom lugar, 
grande mestre! Que assim seja!

Quer saber mais sobre o saudoso professor Nico Rosso? Visite...
www.rosso.com.br


Por: Tony Fernandes – Estúdios Pégasus –
Colaboração: Luiz Rosso (neto do mestre).
Uma Divisão de Arte e Criação da Pégasus Publicações Ltda –
São Paulo – S.P. – Brasil
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